domingo, 29 de agosto de 2010

Luthier

O senhor Olavo trabalha em uma lojinha pequena, na esquina da Carlos de Carvalho com a Santos Dummont, consertando coisas. Objetos que clientes traziam e que, na maior parte das vezes, mesmo não valendo um tostão, faziam questão de que fossem consertadas: relógios antigos, molduras de telas, tapeçarias castigadas por fungos ou traças. Trabalhava como um luthier de bugigangas, mas que apenas reparava objetos criados por outras pessoas. Todas as noites chegava em casa e, sequer cansado de trabalhar, passava horas sozinho pensando no que mais poderia fazer de sua vida. Entre um trago e outro, escrevia o que viesse em sua cabeça e adormecia ébrio a fim de poder sonhar com coisas que já não se lembrava. Desde sempre, amava escrever. Mas não era escritor. Faltava-lhe talento. Não sabia criar. Uma única vez havia escrito um grande poema. Três ou quatro paginas da maravilhosa história de um jovem trovador medieval apaixonado por uma dama da alta corte, aliás, casada. O poema, contudo, não estava acabado. Mas toda a inspiração de Olavo sim. Ele repetia, então, o poema. Todas as noites, para ver se encontrava o final da história. Já havia datilografado centenas de cópias, as quais jaziam pregadas pelas paredes do pequeno apartamento de 3 cômodos e 1 janela. Quando criança sonhara em ser famoso, mas crescera. Agora seu poema está misturado à bugiganga que conserta.

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